A MENTE QUE SE ABRE A UMA NOVA IDEIA JAMAIS VOLTARÁ AO SEU TAMANHO ORIGINAL.
Albert Einstein

domingo, 8 de julho de 2012

A semana na Ciência

Mais perto de Deus

Descoberta anunciada por pesquisadores europeus indica a 

existência de partícula que pode explicar como é formado tudo o 

que se espalha pelo universo

Juliana Tiraboschi
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FESTA
Cientistas do Centro Europeu para a Pesquisa Nuclear, Christopher Llewelyn-Smith,
Lyn Evans, Herwig Schopper, Luciano Maiani e Robert Aymard celebram o anúncio da descoberta
Há cerca de 13,7 bilhões de anos, o Big Bang condenou os átomos a vagar eternamente pelo espaço, solitários, sem alianças. O castigo foi extremamente curto. Um trilionésimo de segundo após a explosão, uma partícula passou a agir como uma espécie de lama, que dificultava a disparada dos átomos. Mais que isso, fez com que as partículas se associassem, dando uma espécie de liga entre elas. Graças a isso, tudo passou a ter massa. Os átomos se juntaram para formar matéria. A partir disso, passou a ser possível a existência de tudo o que há no universo. As estrelas, os planetas, as cidades, os corpos e a revista que está em suas mãos. Escondida desde o Big Bang, a partícula misteriosa começou a ser desvendada na quarta-feira 4.

Sob uma chuva de aplausos no auditório do Centro Europeu para a Pesquisa Nuclear (Cern, na sigla em francês), em Genebra, Suíça, pesquisadores anunciaram a descoberta de uma partícula subatômica consistente com o modelo que descreve o bóson de Higgs, proposto teoricamente há cerca de 50 anos e cuja existência nunca foi comprovada. A probabilidade de os cientistas estarem errados é de 1 em 1,7 milhão. Mesmo assim, dizem que é preciso mais estudos para ter 100% de certeza sobre a existência da chamada “partícula de Deus”. Quando esse dia chegar, todo um novo campo de estudos sobre a física será aberto e muitas perguntas sobre o funcionamento do universo encontrarão uma resposta.

A descoberta foi apresentada por representantes de dois experimentos do Cern, o Atlas e o CMS, que reúnem centros de pesquisa em vários países do mundo, inclusive no Brasil. O fato de dois estudos independentes terem mostrado dados muito semelhantes aumenta a credibilidade da descoberta. “Foi uma surpresa que ambos tenham apresentado dados tão alinhados. Espero que isso faça com que a área de física de partículas retome a vitalidade que tinha no passado”, afirma Sérgio Novaes, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e coordenador do Sprace, sigla inglesa para Centro de Pesquisa e Análise de São Paulo, grupo que participa de pesquisas do Cern. “É a descoberta mais importante da física dos últimos 30 anos”, diz Eduardo Gregores, também professor da Unesp.
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TRABALHO COLETIVO
Fabiola Gianotti e Joe Incandela, profissionais do Atlas e do CMS, os dois centros que
 
A ideia que sustenta a existência dessa misteriosa partícula foi formulada por diversos físicos na década de 1960. Entre eles, o britânico Peter Higgs, que batiza o bóson. Ela foi criada para preencher uma lacuna no Modelo Padrão, a teoria que descreve as partículas elementares que formam toda a matéria que existe no mundo que conhecemos, como as forças agem sobre elas e como elas interagem entre si. O problema é que esse Modelo Padrão só funcionaria se as partículas fundamentais não tivessem massa, mas basta subir numa balança para sentir que a realidade não é assim. Daí surgiu a ideia formulada por Higgs, de que a interação das partículas com um determinado campo causaria um “freamento” delas, criaria uma resistência à mudança da sua velocidade. A massa seria decorrência disso.

“É como se você atirasse uma bala em uma piscina de água. A bala interage com as moléculas da água e é freada. Essa água seria o equivalente ao campo de Higgs, e as moléculas de H2O, que formam o líquido, seriam o equivalente ao bóson de Higgs”, explica Alexandre Suaide, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo que também desenvolve pesquisas no Cern. Essa descoberta é importante porque abre caminho para um entendimento mais profundo sobre nossa própria existência. “Sempre nos perguntamos de onde viemos e para onde vamos. Sabendo como se formam as partículas, os átomos, as estrelas, etc., é possível prever o que vai acontecer com o universo e os planetas no futuro”, diz Suaide.

Muito mais do que os físicos brilhantes que se espalharam pelo palco e pela plateia do centro em Genebra, a descoberta não teria sido alcançada sem o LHC (Grande Colisor de Hádrons, na sigla em inglês), o acelerador de partículas considerado o maior aparato científico já construído pelo homem. Inaugurado em 2008, essa supermáquina consumiu 20 anos de trabalho e cerca de US$ 10 bilhões e pode produzir colisões entre partículas chamadas prótons a uma velocidade quase igual à da luz. O equipamento deveria estar fechado, mas as conclusões mostradas em Genebra animaram os cientistas a mantê-lo em operação até o final do ano, quando esperam ter chegado ainda mais perto da “partícula de Deus”. O LHC ficará fechado para reformas e será reaberto em meados de 2014. Até lá, serão muitas colisões e a utilização de uma massa muito especial: a encefálica.
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ESTRELAS
Abaixo, o físico Peter Higgs é recebido como astro em Genebra,
por conta da partícula que leva seu nome (acima)
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O “criador” da partícula
Nascido em 29 de maio de 1929 em Newcastle, Inglaterra, o físico Peter Higgs é frequentemente descrito como um homem discreto, humilde e avesso aos holofotes. Sempre teve pudor em se referir ao objeto de sua teoria como “bóson de Higgs”. Prefere chamá-lo de “a partícula batizada com meu nome”. Ele escreveu o artigo que descrevia o modelo do campo que depois seria batizado com seu nome em agosto de 1964. Na época, o físico era pesquisador da Universidade de Edimburgo, na Escócia. 

O texto foi submetido ao jornal “Physical Review Letters”, coincidentemente no mesmo dia em que o periódico havia publicado um trabalho sobre o tema, escrito pelos pesquisadores Robert Brout e Franois Englert, da Universidade Livre de Bruxelas. Apesar de ter sido publicada posteriormente, a teoria de Higgs recebeu maior crédito da comunidade, eternizando seu nome na história da ciência. 

“Na época me senti apreensivo antes de conhecer pessoalmente Brout e Englert. Afinal, eles teriam razão para sentirem-se ofendidos”, disse Higgs em entrevista ao jornal inglês “The Guardian” em 2008. “Mas nosso relacionamento sempre foi amigável”, afirmou. Com a nova descoberta anunciada nesta semana, colegas como o renomado físico britânico Stephen Hawking defendem que Higgs seja contemplado com o Prêmio Nobel deste ano.
Fotos: AP Photo/Denis Balibouse; AP Photo/Keystone/Martial Trezzini; AP Photo/Denis Balibouse

Um comentário:

  1. Deus nos concede,a cada dia,uma página de vida nova no livro do tempo.Aquilo que colocarmos nela,corre por nossa conta.

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