Ao tocar o granito, com menor temperatura, perdemos calor para ele
Dulcidio Braz Júnior
No
sul do país o inverno está bem rigoroso. No interior de São Paulo a
temperatura ambiente anda muito baixa, até mesmo durante o dia.
Ontem,
ao final da tarde, fui fazer um café para "dar uma aquecida" e
acompanhar um lanchinho de final de dia. Tenho na cozinha do meu
apartamento um pequeno balcão de granito para lanches rápidos. Quando
peguei a garrafa térmica, com corpo de plástico, sem querer encostei na
pedra do balcão. E senti que o granito estava muito frio, bem mais frio
do que o plástico da garrafa térmica.
Será mesmo verdade que a
temperatua do granito era menor do que a temperatura do corpo plástico
da garrafa térmica? Sem um termômetro para medir as temperaturas destes
objetos, o teste foi feito apenas ao toque da mão. Prevaleceu,
portanto, a minha sensação térmica que indicava que sim: o granito
parecia bem mais gelado.
Mas lembrei-me dos bons conceitos físicos. E divido-os com você.
- Pra
começar, na natureza, os corpos de maior temperatura tendem a perder
calor (ou energia térmica) para os corpos de menor temperatura. Assim,
espontaneamente, corpos mais quentes esfriam enquanto que os mais frios
esquentam. Logo, por conta disso, a tendência natural é que os corpos
acabem atingindo a mesma temperatura. E numa mesma temperatura, não
trocam mais calor e, portanto, mantém a temperatura estável e igual.
Chamamos a esta situação de Equilíbrio Térmico. E a temperatura, neste
caso, é conhecida como temperatura de equilíbrio.
Lembre-se de que o calor passa espontaneamente
do corpo de maior para o corpo de menor temperatura. É preciso haver
uma diferença de temperaturas para que os corpos troquem calor
espontaneamente.
- É comum, num ambiente como a minha cozinha, os objetos trocarem
calor entre si (e também com o ambiente, o tempo todo. Desta forma, é
bastane razoável consideramos que, na média, os corpos neste ambientes
estejam em equilíbrio térmico com o amtiente e, portanto, entre si.
É claro que se você ligar um forno a gás na cozinha, teremos a
liberação de energia térmica pela a combustão que fará com que o
interior do fogão fique mais aquecido do que o resto do ambiente. Da
mesma forma, dentro da geladeira é comum a temperatura ser menor do que
a do ambiente. Mas, tanto no forno quanto na geladeira, temos
processos ativos internos que "gastam" energia para fugir do equilíbrio
térmico com o ambiente. Espontaneamente, é sempre bem razoável
considerarmos que todos os objetos da cozinha estão numa mesma
temperatura. Da mesma forma, todos os objetos da sala ou do quarto ou em
qualquer ambiente estão em equilíbrio térmico porque ficam o tempo
todo trocando calor e buscando equilíbrio.
Com base nos coceitos acima, é fisicamente sensato imaginarmos
que o granito do balcão estava em equilíbrio térmico com o ambiente bem
como a garrafa térmica em equilíbrio com o ambiente e, portanto, com o
granito. Logo, o granito (mais gelado ao toque) não tinha temperatura
menor do que o corpo plástico da garrafa, embora eu pudesse jurar que
sim!
Já de cara, vamos esquecer das mãos como termômetro, certo?
Mão não mede nem sequer estima a temperatura. Mão não é termômetro!
Nossa pele tem sensores térmicos, é fato. Mas estes se adaptam às
situações externas e, portanto, não mantém um padrão fixo para servir
de referência para uma medida confiável. Se você, por exemplo, estiver
lavando louça com água fria da torneira, sem aquecimento, ao tocar no
rosto de uma pessoa pode achar que ela está com febre. Na verdade, a
sua pele se adaptou à situação de baixa temperatura da água e seu
sistema nervoso "acha" que a pele da pessoa está mais quente do que de
fato está. Ao contrário, se estivesse assando pão, em contato direto
com o forno bem quente, tocando a mesma pessoa teria a sensação de que
ela está mais gelada e não tem febre. Então insisto: mão não é
termômetro!
Em segundo lugar, nossa temperatura corporal interna fica por volta dos 36,5
oC.
Somos mamíferos. Na pele, externamente, a temperatuara é ligeiramente
mais baixa (uns dois ou três graus a menos). Mas ainda assim costuma
ser maior do que a temperatura ambiente média. Logo, quando tocamos
qualquer objeto com temperatura menor do que a do nosso corpo, perdemos
calor para ele. Este fluxo de calor para fora do nosso corpo indica
para o nosso sistema nervoso que o objeto tocado está numa temperatura
menor do que a nossa temperatura corporal. Certo? Só que tem um detalhe
importante: cada objeto é feito de um material diferente; e cada
material diferente conduz calor de uma forma diferente. Por isso
classificamos materiais como bons ou maus condutores de calor. E mesmo
dois bons ou dois maus condutores de calor podem ser diferentes entre
si.
O granito é melhor condutor de calor do que o plástico. Assim,
ao tocarmos no granito e no plástico, ambos à mesma temperatura
ambiente, perdemos calor para os dois. Só que para o granito, melhor
condutor, perdemos calor
mais rapidamente. E para o plástico, pior condutor, perdemos calor
mais lentamente.
Nosso sistema nervoso "percebe" esta diferença de fluxo temporal de
calor mas "acredita" que estamos perdendo calor mais rapidamente para o
granito porque ele está mais frio do que o plástico e não porque ele é
melhor condutor. Mais uma vez insisto que nossas mãos não são
termômetros. E acabamos por sofrer esta "ilusão térmica" que na prática
nos confunde quanto às temperaturas dos objetos.
Deu para entender esta sutileza da Termofísica?
É
por isso que alguns tipos de piso (cerâmicos ou de pedra) são chamados
de frios. São materiais que conduzem melhor o calor do que a média. Ao
toque, sempre parecem estar mais frios do que o ambiente. No verão, é
uma delícia andar descalço nestes pisos. Já no inverno, a experiência é
cruel!
:: Alumínio X PET
O alumínio (metal) é melhor condutor de calor do que o PET (plástico)
Para encerrar nosso papo, um outro exemplo bem cotidiano e que aborda uma situação que talvez você já tenha vivido.
Ao
chegar em casa, num dia de verão, louco para tomar algo bem gelado,
você abre a geladeira e, para a sua felicidade, tem refirgerante! E você
tem o mesmo refrigerante em duas opções: em lata e em garrafa PET. Na
dúvida, você toca os dois com a mão para saber qual está mais gelado. E
certamente decide abrir a latinha! Certo?
Agora que você já leu o
meu texto, pergunto: é confiável afirmar que o refrigerante da lata
está mais gelado que o refrigerante da garrafa PET?
Se você respondeu que não, entendeu o espírito da coisa! Veja:
- Mão como termômetro é um desastre, você já sabe.
- E, se tanto a latinha quanto a garrafa foram colocadas na geladeira
há bastante tempo, é muito provável que ambas estejam na mesma
temperatura, na temperatua de equilíbrio térmico do sistema que é a
temperatura interna da geladeira.
- A condutibilidade térmica do metal é certamente diferente da contutibilidade térmica do plástico.
Conclusão: o alumínio (metal) da latinha, melhor condutor do que o PET (plástico) da garrafa, ao toque, vai roubar calor da sua mão
mais rapidamente
e por conta do maior fluxo de calor provocar a "ilusão térmica" de que
a latinha está mais gelada, mesmo que ambas (latinha e garrafa)
estejam na mesma temperatura!
Isso já foi tema de
vestibular e até do ENEM. Se você não conhecia esta importante ideia
física, agora conhece! Faça o teste com diversos objetos ao seu redor
e, mesmo prevendo que estão em equilíbrio térmico com o ambiente e
entre si, vai perceber que para as suas mãos (e o seu sistema nervoso)
uns parecem mais gelados enquanto outros parecem mais frios. Além da
ilusão Óptica, também podemos sofrer ilusão Térmica!