A MENTE QUE SE ABRE A UMA NOVA IDEIA JAMAIS VOLTARÁ AO SEU TAMANHO ORIGINAL.
Albert Einstein

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

+ Rápido que a Luz no Vácuo

::: COMO ASSIM 'MAIS RÁPIDO QUE A LUZ NO VÁCUO'? :::


Albert Einstein: "nenhum corpo pode ter velocidade maior do que c"

Na mês passado caiu na rede uma notícia bombástica sobre um experimento no qual teriam sido detectadas partículas com velocidade maior do que c (c = 299 792 458 m/s, praticamente 300000 km/s, a velocidade da luz no vácuo). Isso não é permitido pela Relatividade Especial (ou Restrita) de Albert Einstein (1879-1955). Ser mais rápido do que a luz em qualquer outro meio é possível. No vácuo não!

No dia seguinte a notícia já estava em todas as mídias e deu origem a especulações e informações erradas, sem contar uma infinidade de pessoas dando palpites furados. Lembrei-me de Galileu Galilei (1564-1642) que disse com muita propriedade "Quanto alguém menos entende, mais quer discordar".
Não acho esse burburinho ruim. Ao contrário, é uma boa oportunidade para quem gosta de divulgação científica ensinar conceitos certos. E é exatamente isso que eu quero fazer neste post.

:: Para começar


Li em muitos lugares a manchete "Físicos do CERN descobrem partícula que supera velocidade da luz". Logo que tomei conhecimento, fiquei curioso e pensando que partícula nova seria essa?
Mas falavam de neutrinos que, definitivamente, não são partículas novas. Eles foram propostos em 1930 por Wolfgang Pauli (1900-1958) e assim batizados por Enrico Fermi (1901-1954) porque seriam como os nêutrons, sem carga elétrica, mas com massa minúscula. Neutrino quer dizer nêutron pequeno.


Pauli e Fermi

Sem carga e massa minúscula, os neutrinos têm dificuldades de interagir com a matéria e por isso mesmo atravessam os objetos de maneira quase "fantasmagórica", o que dificulta o processo de detecção. Não é por acaso que passaram-se 26 anos entre a proposta teórica dos neutrinos e a sua real comprovação experimental que só aconteceu em 1956.

Hoje sabemos que neutrinos estão em toda parte. E somos atravessados por neutrinos que vêm do espaço e bombardeiam a Terra o tempo todo. Mas não sentimos nada.


:: Foto do CERN?
AP Photo / Anja Niedringhaus
Globe: exposição permanente "Unvers des Particules"

A foto acima foi usada em inúmeros portais para ilustrar a notícia sobre os neutrinos. O Globe fica nas dependências do CERN - the European Organization for Nuclear Research, em GEnebra, na Suíça, de onde partem os feixes de neutrinos. Mas o Globe é um local para conferências e encontros de mídia onde existe a Univers de Particules, uma exposição multimídia permanente.


 
Minha visita ao Globe

Mas eu não usaria uma foto do Globe para ilustrar uma matéria sobre o CERN. Embora futurista, ainda mais num clique noturno com a esfera toda iluminada, a imagem é pouco representativa de todo o complexo de pesquisas e pode iludir o leitor de que os experimentos acontecem ali dentro!

:: Por que a velocidade da luz no vácuo é um limite superior no Universo?
Em 1905, ainda muito jovem, Einstein construiu as bases da Relatividade Restrita partindo de dois postulados:
  1. O movimento absoluto uniforme não pode ser detectado.
  2. A velocidade da luz é absoluta, ou seja, é independente do observador.
O primeiro postulado reforça o laço da nova teoria com a Mecânica Clássica de Isaac Newton (1643-1727). Ao tentar unificar o Eletromagnetismo (do final do século 19) com a Mecânica Clássica (do século 17) Einstein não estava derrubando Newton mas apenas compatibilizando as ideias clássicas com situações novas de velocidades não desprezíveis em relação à velocidade da luz no vácuo. Einstein preservou Newton! E podemos dizer que a Relatividade Restrita corrige a Mecânica de Newton para velocidades altas, não desprezíveis em relação à c.

O segundo postulado veio dos experimentos mentais de Einstein. Foi intuição do cientista ou, como alguns mais maldosos gostam de dizer, um mero chute. Não vou entrar no mérito desta questão.

É bem verdade que a Relatividade Restrita chegou a resultados bizarros, como por exemplo a relatividade do tempo. Como podem dois observadores diferentes medirem intervalos de tempo distintos para um mesmo evento? Mas, por mais exótico que isso possa parecer, a teoria foi comprovada na prática, em diversos experimentos. Logo, os postulados, em especial o tal "chute", têm consistência e dão sustentação à teoria!

Na Relatividade existe um fator de correção, o gama (γ) ou fator de Lorentz, que pode ser demostrando com certa facilidade usando conceitos de Física e Geometria de Ensino Médio. . O fator γ é dado por:


onde v é a velocidade de um corpo qualquer e c a velocidade da luz no vácuo.

A tabela a seguir mostra o cálculo de γ para alguns valores de v em função de c. E logo abaixo um gráfico ilustra o curioso comportamento matemático de γ em função da velocidade v de um corpo.


Note que a velocidade v deve crescer muito em comparação com c para que γassuma um valor significativamente maior do que 1. Em outras palavras, para velocidades baixas, γ = 1 e não precisamos fazer nenhuma correção relativística. Nestas condições, a Mecânica de Newton funciona perfeitamente bem. Já para velocidades mais altas, precisamos aplicar uma correção γ > 1. E, quanto mais perto de c estiver a velocidade v do corpo, maior fica γ, até que para v = c a correção γ explode para infinito!

E é aí que entra o limite superior de velocidades. Einstein argumentou que, dentre outras grandezas, a massa inercial de um corpo também precisa de correção relativística. Na Relatividade a massa inercial não é mais uma constante pois depende da velocidade do corpo. Se você, por exemplo, tem 80 kg medidos por uma balança parada, essa é a sua massa de repouso m0. Basta caminhar para que a sua massa inercial aumente para m > mtal que:

 

É claro que numa caminhada típica, com v << c (velocidade muito menor que a da luz no vácuo), teremos γ praticamente igual a 1 e, portanto, massa inercial imperceptivelmente maior do que a massa de repouso.  Mas, se a velocidade do corpo crescer e tornar-se não desprezível em relação à c, o fator γ começa a ficar cada vez maior tornando m muito maior do que m0, o que inviabiliza novos incrementos de velocidade.

Explicando um pouco melhor essa ideia:


I) Para Newton
Um corpo de massa m (constante) submetido a forças que dão uma resultanteR será acelerado numa taxa a (aceleração) tal que:
R = m.a
A expressão acima é o Princípio da Inércia de Newton que nos sugere que, enquanto houver força resultante R atuando sobre um corpo de massa inercialm constante, por menor que seja R, haverá uma aceleração a = R/m. Em outras palavras, o corpo continuará ganhando velocidade numa taxa a, sem nenhum limite, e pode até mesmo superar a velocidade c da luz no vácuo.


II) Para Einstein
A aceleração do corpo continua sendo  a = R/m.
Mas m não é mais constante pois depende de v . Certo?

Assim, se m aumenta com v, para mantermos uma aceleração a, ou seja, para continuarmos aumentando a velocidade do corpo na mesma taxa, precisamos compensar o aumento de m aumentando continuamente a força resultante R.
Só que isso terá um limite prático! Note que quanto mais a velocidade v do corpo cresce, maior fica o fator γ que tende para infinito quando v tende para c. Nesse caso, se v = c, a massa inercial m = γ.m0  também tende para um valor infinito. Em outras palavras, precisaríamos de uma força resultante R infinita para compensar a massa incercial m infinita e continuar acelerando o corpo. Mas, onde vamos conseguir resultante R infinita?  Não tem como!
É por isso que, na Relatividade Restrita, qualquer corpo deixa de ser acelerado quando atinge velocidade v = c. Em outras palavras, a sua velocidade não cresce mais, ou seja, atingiu um valor máximo v = c.
Entendeu?


:: O experimento OPERA
Os neutrinos supostamente mais rápidos do que a luz no vácuo foram detectados no OPERA que está situado no LNGS - Laboratório Nacional de Gran Sasso, na Itália.
Mas os neutrinos vêm do CERN, viajando 732 km por dentro da Terra, em linha reta.


Não existe um tunel subterrâneo ligando Genebra (A) e Gran Sasso (B). Os neutrinos atravessam tudo! Lembra?

A ideia original do OPERA é estudar a oscilação dos neutrinos, ou seja, a suposta transição dos neutrinos do Muon em neutrinos do Tau. Em A são emitidos neutrinos do Muon. Algns deles, quando chegam em B, converteram-se em neutrinos do Tau.

Mas, nesta viagem dá para medir com rigor o minúsculo tempo Δt de ida dos neutrinos de A para B. E constatou-se uma diferença de 60.10-9 s para menos neste Δt o que significa V > c para estas partículas! De duas uma: ou há um erro no experimento, repetido mais de 15000 vezes, ou alguma novidade revolucionária na Física!
Veja o artigo original que descreve o experimento em detalhes. Ele foi distribuído para apreciação da comunidade científica internacional.


:: Se os resultados se confirmarem, "quebramos" Einstein?

Com o aparecimento da Relatividade Restrita, não dá para dizer que Newton errou. Para velocidades baixas ele acertou na mosca! Tanto que até hoje usamos a Mecânica Newtoniana, desde que estejamos lidando com v << c .  Por exemplo: numa viagem, ainda que num avião a jato cuja velocidade é v = 1000 km/h, apenas 0,003c, não faz sentido usarmos Relatividade para calcularmos o tempo total de jornada. Usamos Mecânica Clássica e está tudo certo!
O exemplo acima é simples mas nos mostra algo muito importante e que vai na contramão do que pensa a maioria das pessoas: em Ciência não tem certo ouerrado e sim funciona ou não funciona!

Assim, uma ideia vai bem até que deixa de funcionar e precisa de correção. Mas funcionou até ali, dentro daquelas condições de contorno. Se nos mantivermos dentro das mesmas condições, podemos usar a ideia antiga que ainda vai funcionar muito bem. Mas, se ultrapassarmos os limites previstos pela teoria, precisamos agregar correções. Simples assim. E sem traumas!

Se o estranho resultado do experimento do Gran Sasso se confirmar, pode estar surgindo aí a necessidade de corrigir a Relatividade Restrita que sobreviveu muito bem até agora, pouco mais de um século de existência. E isso não quer dizer necessariamente que Einstein errou. Uma nova porta pode se abrir. É assim que a Ciência evolui e nos mostra que ainda estamos  tateando os segredos do Universo e temos muito o que aprender!
Por isso fico sempre torcendo por grandes e reveladoras novidades, o que faz da Ciência algo muito instigante e especial, sempre!

Fonte: prof. Dulcidio Braz Júnior

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