A MENTE QUE SE ABRE A UMA NOVA IDEIA JAMAIS VOLTARÁ AO SEU TAMANHO ORIGINAL.
Albert Einstein

sábado, 1 de outubro de 2011

o BIG-BANG de João mangeijo



JOÃO MAGUEIJO: Uma História de Coragem


Cosmologista e professor de física teórica em Inglaterra, João Magueijo tem desenvolvido investigações acerca da origem e evolução do universo, estudando os aspectos mais complexos e que ainda se encontram por explicar no âmbito da teoria do Big Bang.
Recentemente, notabilizou-se como autor da teoria VSL (Variable Speed of Light), que procura explicar um dos grandes mistérios da cosmologia moderna (o problema do horizonte) com base no postulado de que a velocidade da luz nem sempre terá sido constante.
Enfrentou uma forte oposição por parte da comunidade científica, que o acusou de anarquia e heresia, simplesmente por colocar em causa os pilares da relatividade e de grande parte dos conhecimentos físicos actuais.
Vida
João Magueijo nasceu na cidade portuguesa de Évora, corria o ano de 1967. Fascinado pelos mistérios da física, cedo descobriu a sua veia científica e leu Einstein pela primeira vez aos 11 anos. Estudou física na Universidade de Lisboa e completou o curso em Cambridge, onde prosseguiu os seus estudos com horizontes mais alargados.
Evidenciou-se de tal forma pela sua inteligência e energia na investigação científica que foi integrado numa parceria de pesquisa com outros cientistas que igualmente se destacaram, no Saint John’s College de Cambridge. Posteriormente, foi membro das faculdades de Princeton e de Cambridge, estando actualmente a leccionar física teórica no Imperial College de Londres. As suas aulas incidem particularmente sobre a Teoria da Relatividade Geral, de Albert Einstein.
Carreira Científica
Em 1998, João Magueijo trabalhou com Andreas Albrecht naquela que viria a ser uma das mais revolucionárias teorias da física moderna: a VSL (Variable Speed of Light). Conforme explicarei posteriormente, esta concepção científica procura responder ao problema do horizonte supondo que a velocidade da luz teria sido muito superior durante os primeiros tempos de vida do universo.
Uma particularidade interessante associada à criação desta teoria reside no facto de João Magueijo não a ter descoberto sentado à sua mesa de trabalho no escritório, nem tão pouco no decorrer de investigações laboratoriais. Surpreendentemente, toda a teoria partiu de uma ideia que lhe ocorreu enquanto deambulava pelas ruas de Londres, num dia chuvoso, após uma extenuante festa nocturna. Posteriormente, os cálculos matemáticos inerentes à formação da teoria foram realizados durante as suas férias em Goa, e não em ambiente de trabalho.
A teoria VSL encontra-se explicada detalhadamente na obra Mais Rápido do que a Luz: a História de uma Especulação Científica, publicada por João Magueijo em 2003. A teoria também foi dada a conhecer ao mundo através de um documentário exibido no canal Discovery Science, que expõe o essencial da VSL de uma forma simples e sugestiva, estando disponível online.
No entanto, esta proposta de resolução do problema do horizonte gerou uma grande polémica entre os restantes físicos, que viam posta em causa a constância da velocidade da luz, princípio fundamental de toda a física moderna.
Problema do Horizonte
Como se sabe, a teoria do Big Bang, sustentada por diversas provas concretas da sua evidência, sendo actualmente a mais aceite para explicar, em traços gerais, a origem e a evolução do universo, tem ainda algumas lacunas, na medida em que levanta diversas questões para as quais não tem resposta. Uma delas consiste no problema do horizonte, decorrente de informações paradoxais associadas ao universo.
Para compreendermos o problema do horizonte, devemos ter em conta que o universo se encontra em permanente expansão, a uma grande velocidade, o que resulta num afastamento dos corpos celestes, criando distâncias enormes entre eles. Recordemos também que a troca de informação entre duas galáxias tem de se processar necessariamente através da radiação electromagnética, que se desloca a uma velocidade finita (o valor da velocidade da luz no vácuo).
Confrontando os dois factos enunciados anteriormente, verificamos que, devido ao ritmo acelerado da expansão do universo, algumas galáxias nunca poderiam ter estabelecido contacto entre si através da radiação electromagnética, pelo que as suas características deveriam ser necessariamente diferentes. No entanto, as observações astronómicas mostram que, contrariamente aos resultados dos cálculos matemáticos, as galáxias apresentam uma configuração semelhante, um conjunto de características comuns.
Esta incompatibilidade, este antagonismo entre a homogeneidade dos corpos celestes e a impossibilidade de uma troca de informação no passado, constituem verdadeiramente o problema do horizonte. Na tentativa de o resolver, muitos cosmologistas têm realizado diversas investigações, baseados em cálculos e observações cosmológicas, criando diversas teorias, das quais se destaca a teoria inflacionária (teoria da inflação cósmica).
Inflação Cósmica
A teoria da inflação cósmica surge solução mais aceite actualmente para o problema do horizonte e as restantes questões relativas à origem e evolução do universo, associadas ao Big Bang.
Segundo esta teoria, o universo terá passado por uma primeira fase de grande expansão, a uma velocidade descrita por uma função exponencial, motivando um brutal aumento do volume do universo, numa fracção ínfima do seu primeiro segundo de existência. Esta expansão do universo a uma velocidade alucinante seria o resultado de algo tão estranho como uma gravidade repulsiva ou uma densidade de energia no vácuo.
Durante a fase inflacionária, ter-se-á verificado progressivamente a separação das quatro interacções fundamentais, unificadas no início desta era inflacionária. Segundo a teoria, após o período de inflação, o universo terá continuado em expansão, mas a um ritmo muito inferior ao verificado na fase inflacionária.
A teoria da inflação cósmica pretende solucionar o problema do horizonte partindo do pressuposto de que, antes da era inflacionária, toda a matéria estava condensada, em condições que favoreciam a ocorrência de interacções. Considerando que as propriedades físicas teriam surgido no início da era inflacionária, quando todas as partículas do universo se encontravam concentradas de um modo que permitia a troca de informação entre elas, teria ocorrido uma homogeneização das características do universo nesses instantes primordiais da fase inflacionária.
Assim, as semelhanças registadas actualmente entre galáxias de locais distintos do universo serão, de acordo com a inflação cósmica, o resultado de uma interacção entre todas as partículas ocorrida no início da era inflacionária, quando toda a matéria ainda se encontrava agregada. Esta teoria resolve assim o problema do horizonte, desfazendo o paradoxo que está na sua origem. Porém, a teoria não encontra facilmente uma confirmação ao nível das observações cosmológicas, possibilitando o surgimento de hipóteses alternativas, como a teoria VSL (Variable Speed of Light) de João Magueijo.
VSL (Variable Speed of Light)
Não encontrando evidências observacionais que pudessem comprovar a veracidade da teoria inflacionária, João Magueijo questionou esta visão do universo e procurou uma concepção diferente, que também permitisse solucionar o problema do horizonte. A sua investigação debruçou-se sobre uma hipótese muito simples, mas de tal modo radical que nunca ninguém antes ousara colocar: e se a velocidade de luz não tivesse sido sempre constante?
Como se sabe, a constância da velocidade da luz representa um dos postulados fundamentais nos quais assenta a física moderna. Princípio subjacente à relatividade einsteiniana, a velocidade da luz é uma das constantes dimensionais nas quais se baseia toda a compreensão da estrutura e evolução do universo. Ainda assim, João Magueijo deu seguimento à exploração desta hipótese e atingiu conclusões bastante interessantes, nascendo a teoria VSL.
Em traços gerais, João Magueijo propôs que a velocidade da luz nem sempre tivesse tomado o valor actual da velocidade da luz no vácuo, não sendo por isso constante ao longo do tempo. De acordo com as suas pesquisas, quando o universo ainda era jovem, a velocidade de propagação da luz terá sido muito superior ao valor verificado actualmente: cerca de 60 vezes superior a c.
Como resultado, a troca de informação entre corpos celestes em expansão teria sido possível, através de uma transferência de radiação electromagnética. Tal fenómeno conduziria a uma homogeneização do universo, responsável pela semelhança nas características das galáxias que se constata a partir das observações astronómicas do presente. Posteriormente, a velocidade da luz teria diminuído abruptamente, fixando-se nos 300 mil milhões de metros por segundo. Assim, João Magueijo encontra uma resolução simples do problema do horizonte, contornando a inflação cósmica, embora tal inovação implique colocar em causa a constância da velocidade da luz, sobre a qual assentam grande parte dos fundamentos da física moderna.
Contestação da VSL
Conforme expliquei anteriormente, a sugestão de que a velocidade da luz possa não ter sido constante ao longo da História do universo questiona inevitavelmente as bases da teoria da relatividade, da autoria de Einstein, considerada um dos pilares mais preciosos da física moderna. De facto, colocar em causa a constância da velocidade da luz significa duvidar de todo o conhecimento físico da actualidade, ao abalar de forma violenta os fundamentos das teorias que procuram explicar o universo. Esta é uma das razões, porventura a principal, pela qual a teoria VSL tem sido tão criticada pela comunidade científica.
Por outro lado, a teoria VSL apresenta o defeito de se encontrar excessivamente direccionada para o problema do horizonte, revelando-se, pelo menos até ao momento, incapaz de responder às outras questões colocadas em relação à origem e evolução do universo, nomeadamente o problema da planaridade do universo e o problema dos monopólos magnéticos.
Além disso, outros cientistas, como Ellis e Uzan, acusam João Magueijo de ter fundado uma teoria científica baseada apenas numa alteração das equações matemáticas inerentes às leis da física, sem se basear num princípio científico subjacente. De acordo com estes investigadores, a VSL seria apenas o resultado de um jogo de cálculos, nascendo uma solução para o problema do horizonte baseada nestas vagas experiências matemáticas.
Como resultado, João Magueijo tem sido visto pela comunidade científica como um anarquista, sendo os seus estudos conotados com heresias e radicalismos. A suposta ausência de sentido nas suas investigações leva os outros físicos a tecer estas acusações insultuosas a um colega de trabalho que tem lutado arduamente pelo mesmo sonho que eles, apenas por decidir inovar e apresentar ao mundo uma teoria nova, que questiona as concepções anteriores. Assim, visto como um físico rebelde, João Magueijo tem sido descredibilizado pela generalidade da comunidade científica.
A reacção de João Magueijo
No documentário produzido para a Discovery em 2008, Magueijo apresentou a sua forma serena de enfrentar a grande oposição que enfrenta por parte da comunidade científica, procurando conservar-se relativamente indiferente em relação à chuva de críticas dirigidas às suas pesquisas e prosseguindo tranquilamente as suas investigações.
Com alguma ironia à mistura, João Magueijo considera normais as críticas que vão surgindo em resposta à sua teoria, admitindo que muitas pessoas possam recusar admitir a possibilidade de a velocidade não se ter mantido constante ao longo da História do universo. Entendendo a relutância dos físicos em proceder a uma reformulação da teoria da relatividade e compreendendo a inexistência de evidências que confirmem a VSL, João Magueijo não se deixa importunar por quem insistentemente o critica e continua a desenvolver as suas investigações nesses capítulos.
Conforme afirma na parte final do documentário, a física é construída a partir do surgimento de várias teorias que procuram explicar os fenómenos, sendo posteriormente confrontadas umas com as outras, confirmadas ou refutadas com base em evidências observacionais e reformuladas para fazer face às novas exigências. Este dinamismo subjacente a toda a ciência é suficiente para tornar valiosa a sua VSL, pois constitui uma alternativa bem fundamentada às restantes teorias cosmológicas, podendo eventualmente estar certa, ou pelo menos parcialmente. O documentário fecha com uma afirmação épica de João Magueijo, encarando a possibilidade de a sua teoria estar errada:

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