A MENTE QUE SE ABRE A UMA NOVA IDEIA JAMAIS VOLTARÁ AO SEU TAMANHO ORIGINAL.
Albert Einstein

domingo, 16 de outubro de 2011

A Semana na Ciência


O ateliê de 100 mil anos

Descoberta de caverna onde nossos ancestrais 

produziam e estocavam tinta mostra que eles tinham 

conhecimentos de química e transmitiam ensinamentos 

entre gerações há mais tempo do que se imaginava

André Julião
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A maquiagem e as roupas coloridas remontam a uma época quase tão antiga quanto a do surgimento do próprio homem moderno. Muito antes da pintura nos olhos de Cleópatra, no Antigo Egito, o uso de minerais para colorir e proteger a pele, ou mesmo as roupas, era comum entre nossos ancestrais. Um novo estudo conclui que esse costume é bem anterior ao que imaginávamos. Arqueólogos descobriram uma espécie de ateliê na caverna Blombos, na África do Sul, onde, há 100 mil anos, humanos preparavam tintas à base de minerais. As evidências anteriores mais antigas eram de, pelo menos, 50 mil anos depois. O estudo foi divulgado na semana passada pela prestigiada revista científica “Science”.

A pesquisa, liderada pelo arqueólogo Christopher Henshilwood, da Universidade do Witwatersrand, em Johanesburgo, é baseada em artefatos encontrados em 2008 na caverna, localizada a cerca de 300 quilômetros da Cidade do Cabo. No local foram achados dois conjuntos de ferramentas de ossos, pedras e conchas. Além desses objetos, os arqueólogos encontraram vestígios de carvão e ocre – um tipo de terra ou pedra que contém óxidos vermelhos ou amarelos ou hidróxidos de ferro (que dão aspecto de ferrugem ao mineral).
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PALETA 
A concha encontrada na caverna era usada para misturar pigmentos há milhares de séculos
“Nossa descoberta mostra que os humanos que viviam na caverna Blombos, 100 mil anos atrás, podiam transmitir conhecimento de uma geração para outra”, disse à ISTOÉ um dos autores do estudo, Francesco d’Errico, da Universidade de Bordeaux, na França. “Esse aprendizado envolvia uma variedade de materiais brutos, incluindo três diferentes tipos de mineral, concha, osso, gordura, carvão e moedores de diferentes tipos”, explica.

Segundo Henshilwood, o ocre foi aplicado com motivação simbólica no corpo e em vestimentas durante aquela época, a Idade da Pedra Média. “Essa descoberta representa uma importante referência na evolução de uma cognição humana complexa”, diz. “Ela mostra que o homem tinha habilidade para pesquisar, combinar e estocar substâncias que eram usadas para, provavelmente, reforçar as práticas sociais”, diz o pesquisador.

Os cientistas acreditam que o processo de manufatura envolvia a fricção de peças de ocre em placas de quartzo para produzir um fino pó vermelho. Ele era então misturado a algum líquido, dentro de uma concha. Um osso provavelmente era usado para mexer a mistura e tirá-la do recipiente, quando finalmente era aplicada na pele ou em roupas. Não foi difícil para os pesquisadores supor a finalidade da tintura, já que até hoje ela é usada por tribos africanas.
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ARTISTAS
Pesquisadores no interior da caverna Blombos (topo), na África do Sul
“As mulheres himba, do norte da Namíbia, passam a vida toda completamente cobertas por uma mistura de um mineral vermelho e manteiga”, explica D’Errico. O “creme” tem como função proteger a pele e os cabelos do calor. As mulheres hamer, da Etiópia, também usam minerais e manteiga nos cabelos. Da mesma forma, os homens karo, do mesmo país, usam barro branco como repelente de mosquitos e outros minerais para fazer um tipo de penteado, que é retocado até o fim da vida.

Os pesquisadores concluem que a recuperação desses kits de pintura acrescenta evidências de avanços tecnológicos e comportamentais do Homo sapiens, além de revelar como nossos ancestrais já eram capazes de planejar, produzir e manter suas tintas. A descoberta prova ainda que eles tinham um conhecimento elementar de química e a capacidade de fazer planos de longo prazo. Adeptos ou não da maquiagem que quiserem ver de perto esse capítulo da pré-história podem observar os objetos no Museu Iziko, na Cidade do Cabo, onde começam a ser expostos nesta semana.

Buraco sobre o Polo Norte

Uma nova perda na camada de ozônio, agora na região 

acima do Ártico, mostra como a atividade humana 

exerce influência direta sobre o clima do planeta

André Julião
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SÍMBOLO
Urso-polar vaga pelo que resta de seu hábitat natural no Ártico
A maior bandeira ambiental dos anos 1980 está de volta às manchetes. Mas o buraco na camada de ozônio sobre o Polo Sul não é mais o problema. Uma nova perda do gás, essencial para proteger a Terra dos raios ultravioleta, ocorre agora sobre o Ártico, no polo oposto do planeta. O fenômeno foi detectado pela primeira vez em 1985 e, quatro anos depois, um acordo global proibiu a fabricação de produtos que causassem danos ao escudo gasoso. Este ano, porém, os cientistas identificaram um novo buraco, consequência direta dos poluentes emitidos antes do tratado – conhecido como Protocolo de Montreal e assinado por 191 países.

Um frio intenso na atmosfera superior do Ártico no último inverno ativou produtos químicos que estão presentes no ar e danificam a camada de ozônio, como o clorofluorcarbono (CFC). Eles produziram um buraco de tamanho sem precedentes na região, pouco menor que as áreas dos Estados do Amazonas e Pará juntos. O estudo foi publicado na revista especializada “Nature”. 

Embora a perda de ozônio no Norte seja considerada temporária – e bem inferior à perda que ocorre na Antártica, no Polo Sul – cientistas descrevem o evento como um exemplo notável de como anomalias repentinas podem ocorrer, como resultado direto da atividade humana de anos atrás (conheça outros perigos da perda da camada de ozônio no quadro nesta página). E isso graças ao CFC encontrado em sprays, motores de geladeira e isopores, além de outros elementos presentes em pesticidas, por exemplo.
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MONITORAMENTO
Satélite Aura, da Nasa, é essencial para medir a camada de ozônio e os gases
que a destroem, mas está no fim da sua vida útil e não tem um substituto programado
Desde o ano 2000, as concentrações desses poluentes declinaram na atmosfera, mas não mudaram muito em relação à época em que o primeiro buraco na camada de ozônio foi identificado. “A causa principal desse fenômeno são os elementos químicos emitidos ao longo do século XX”, afirmou Michelle L. Santee, do Jet Propulsion Laboratory, da Nasa, uma das autoras do estudo. “Eles têm uma vida longa, podem levar décadas para desaparecer. Essa nova zona é um lembrete de que as atividades humanas podem ter um impacto muito significante e, algumas vezes, consequências não intencionais na atmosfera”, diz a pesquisadora.

Apesar de concordarem a respeito da gravidade do problema, cientistas que monitoram o Ártico concordam que mais dados são necessários. O monitoramento é produzidos com balões, observatórios e satélites, mas estes últimos não são feitos para durar muito tempo. Os instrumentos presentes na nave Aura, da Nasa – que mede gases e nuvens e foram essenciais para esse estudo – foram desenvolvidos para durar cinco anos e já acumulam sete em atividade. “Não há planos imediatos para outros satélites que nos deem o mesmo tipo de dados”, diz Gloria Manney, outra autora do estudo. “Uma de nossas preocupações é saber qual será a capacidade para monitorar não só o ozônio, mas os elementos que o destroem.”  
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